A História Real da Vida Real

E eis que começa meu último ano no colégio. Cheguei ao colégio mais cedo que o habitual, pois estava muito nervoso, com saudades de Nicole. Mas ela chegou atrasada até!

Janice, que era mais uma vez nossa coordenadora, levou os alunos dos três terceiros para a quadra, com a intenção de abrir o ano de uma maneira diferente, ao menos foi o que pude imaginar. Então Nic entrou pela porta da quadra, uns dez minutos atrasada, e quando Janice já estava começando.

— Bom dia a todos! Espero que tenham descansado bastante nas férias, dormido muito e que não tenham estudado nada.

Todos riram nesse momento, mas eu nem estava prestando atenção, pois estava me espremendo todo, sentado no chão, para ver se abria um espaço do meu lado e Nicole se interessava por vir sentar nele. Ela, apesar do jeans surrado e da blusa sem graça da farda, estava tradicionalmente deslumbrante. Seus cabelos umedecidos deveriam estar emanando um perfume conhecido, mas ela estava muito longe para que eu pudesse sentir. Desejei naquele momento ser o ar, para poder me misturar com aquele perfume e chegar pertinho dela, tocar a sua pele.

Mas enquanto eu curtia meu devaneio, ela se sentou ao lado de Amanda e Janice continuava:

— Esse será o ano mais difícil de vocês na escola. Há um grande acúmulo de conteúdo nas matérias e ao final do ano haverá o vestibular. É muito importante dar tudo de si e passar de primeira para não atrasar a vida. Então se esforcem. Vale a pena.

— Essa semana será diferente da primeira semana de aula à qual vocês estão acostumados. Não teremos aulas.

Todo mundo vibrou!

— Vocês virão aqui durante os dois turnos a semana inteira para ter palestras e demonstrações práticas com profissionais de todos os cursos universitários que pudemos reunir, e no sábado pela manhã realizaremos um teste vocacional com nossa psicóloga, Mary Beth. Friso que é importante a participação em todos os dias para conhecer melhor as carreiras e poder escolher sua profissão com menores chances de errar.

Quando ela terminou de falar, houve um burburinho geral e eu me pus a pensar na minha profissão. O que eu iria fazer da vida? Nunca tinha parado pra pensar.

— Convido agora o PhD em Matemática Dr. Hilbert para debater com vocês a carreira de matemático, como é a vida acadêmica e o sentido de viver da pesquisa científica.

E a semana voou.

Tivemos palestras de médicos de diferentes áreas, de um psicólogo, de formados em Letras, em Computação, em Design, em Administração, em Ciências Contábeis, de um fisioterapeuta, uma ortodontista, entre outras diversas profissões.

Não tive muito tempo para conversar com Nic, pois era uma palestra atrás da outra, e como foi nos dois turnos, não tive tempo nem pra respirar. Mas pude perguntar como foram as férias dela, ela disse que foram chatas, que não viajou e tal. Putz, eu poderia tê-la convidado para sair! Mas... é tarde para me lamentar.

Na sexta pela manhã assisti à palestra que definiu meu futuro. Uma equipe de profissionais da área de videogames, especialistas em jogos de todos os tipos, e em todas as áreas de desenvolvimento. E como as palestras eram em telões utilizando datashow e um computador, eles puderam dar rápidos exemplos de como é desenvolver um jogo. Então me lembrei de que jogar videogame sempre foi algo que muito amei. E quis, mais do que tudo, ser um desenvolvedor de jogos. Eles então deram uma lista das poucas universidades do país que apresentavam esse curso, e felizmente uma da nossa cidade o possuía.

Mais animado do que nunca com a possibilidade de fazer meus próprios jogos, cheguei para o teste vocacional um pouco desinteressado. Eu sabia que não poderia mudar o que eu já tinha escolhido.

— Olá a todos. Sou a nova psicóloga do Aristóteles, Mary Beth, e estamos aqui reunidos para fazer um teste vocacional. Não se preocupem, não tomarei muito do sábado de vocês.

Então três professores a ajudaram a distribuir os testes. Tinha perguntas meio malucas, como para colocar formas geométricas em grupos, e tinha perguntas de conhecimentos gerais, mas a grande maioria era de cunho pessoal.

— Quem for terminando venha me entregar e lembre de pegar seu horário na saída da quadra, com Janice.

Fiz meu teste, preenchi o resultado em um gabarito e quando fui entregá-la, ela já fez a avaliação. Colocou a folha do gabarito em uma máquina ligada a um computador e apareceu na tela do computador que eu me daria bem em áreas de raciocínio lógico, como computação, matemática ou alguma engenharia.

— Professora, eu...

— Não sou sua professora, apenas a psicóloga. Mas continue.

— Eu gostei muito das palestras, mas me interessei pela área de desenvolvimento de jogos de videogame. A senhora acha que encaixa com o que o computador disse?

— Ah, sim! Jogos também são uma forma de raciocínio lógico! Parabéns, Max! Muito bem, escolheu uma área promissora!

Notei que ela tinha visto meu nome na folha do teste.

Dirigi-me à porta e saí feliz com o meu novo horário. Eu terei agora aulas não só pelas manhãs, mas de segunda a quinta durante as tardes também. Creio que todos ficarão tristes com essa notícia, mas pra mim significava ver Nicole quatro turnos a mais! Quase o dobro de vezes! Isso era fantástico, ah se era!