A semana foi passando e eu pensando. Como eu iria dizer? Que palavras iria usar? Ensaiei a conversa em minha mente dezenas de vezes. E imaginei todas as possibilidades de resposta.

"— Babi, eu tou gostando de você.

— Tá doido? Somos só colegas de RPG! Se liga!"

Irreal demais, ela não vai me tratar assim tão mal.

"— Podemos conversar, Babi?

— Claro, Max.

— Então, eu tou gostando de você.

— Sério? Que bom, Max. Porque eu te amo desde o instante em que te conheci. Casa comigo?"

Irreal demais, não vai acontecer algo assim.

"— Babi, desde a festa da sexta passada eu tou afim de você. O que você sente em relação a isso? Quer namorar comigo?

— Ah, Max, não vai dar. Na verdade, eu já tenho namorado."

Argh, será?

"— Quando nossos olhares se cruzaram, foi como se um novo big bang tivesse ocorrido em meu coração, desencadeando um processo infinito e quântico de expansão das minhas emoções.

— Hein?"

Nerd demais.

"— Nem a luz do sol, ou o azul do mar, ou a força do vento, ou a alegria de uma criança, nada disso pode explicar o que sinto por você."

Poético demais, eu não sou assim.

"— Acho que estou gostando de você, Babi.

— Eu também, Max.

— Quer namorar comigo?

— Sim, agora mesmo!"

É, quem sabe? Seria legal essa!

Na quinta à noite telefonei para ela.

— Babi?

— Oi, Max! Tudo bom?

— Tudo sim, e contigo?

— Tudo tranquilo.

— Então, eu... é que... sabe...

— Hum?

— Você tem aula amanhã à tarde?

— Até as 16 só.

— Não quer tomar um sorvete comigo após a aula?

— Claro! Onde te encontro?

— Lá naquele quiosque por trás da Biblioteca, pode ser?

— Estarei lá!

— Tá... Até amanhã, então.

— Até!

Ela vai... E agora? Menos de 24 horas!!!! Amanhã toda a minha vida pode mudar! Ou melhor, VAI mudar! Aquela troca de olhares da gente disse tudo! Ela gosta de mim!

Amanhã à noite eu terei uma namorada!

Demorei horrores para adormecer nessa quinta. Continuei imaginando as possibilidades. Me imaginei levando-a ao cinema. Me imaginei beijando-a no quiosque, após um sorvete. Inúmeras situações passaram pela minha cabeça até que o sono resolvesse me pegar.

Sexta pela manhã assisti aula, e após o almoço fui dar uma volta pela Universidade, esperando dar 16hs. 15:30 fui para o quiosque. Eu estava muito nervoso. O que ia acontecer? Ela ia dizer que estou maluco! Não, ela ia dizer que gostava de mim! Ai, ai, que angústia!

Fiquei observando as pessoas ao meu redor, e às 15:50 Babi apontou no horizonte, se encaminhando para onde eu estava. É chegada a hora.

E eu estava apaixonado novamente...

Definitivamente, Nic era coisa do passado. Agora eu tinha outra garota em minha cabeça. A doce Babi. Nic era muito extrovertida, direta e, de certa forma, agressiva. Já Babi era meiga e inteligente. E tinha aqueles olhos amarelos... E o sorriso que parece ser capaz de desarmar as pessoas.

Passei o sábado pensando nela. Relembrando o dia em que nos conhecemos. As partidas de RPG. E a festa da noite anterior. Sempre uma festa? Curioso pensar que eu não curto muito festa e pela segunda vez seguida, me apaixono em uma. Bem, talvez isso não seja bem verdade. Nos dias que antecederam aquela festa do 1º ano eu já estava gostando de Nic, mas não tinha consciência do fato. Agora não. Até a noite passada, eu estava achando a Babi legal, mas não sentia nada.

Após muitas reflexões chegou o domingo. Fui encontrar com a galera pra jogar RPG, como de costume. Consegui sentar do lado dela na partida. Ela estava de jeans e blusa preta. Em um momento da partida, meu personagem ficou preso em uma masmorra e eu não podia fazer muita coisa, então fiquei mexendo no cabelo dela, enquanto o pessoal jogava. Enquanto passava minhas mãos através dos fios sedosos de cabelo, pensava que eu não podia deixar mais essa oportunidade passar. Decididamente, eu tinha que deixar a timidez de lado e agir. Mas como? O que fazer?

Quando acabamos o jogo, falei com Gary baixinho:

— Gary, eu quero falar contigo, pode ser?

— Beleza, velho. Deixa só a galera sair.

E quando todos tinham ido eu comecei:

— É que eu acho que tou gostando da Bárbara.

— Caraca! É sério?

— Pois é.

— Que maneiro, meu irmão!

— Pois ééé...

— Vou te dizer, e eu tou afim da Julianne!

— Eita!

— Essa semana vou falar com ela.

— Vai??

— Claro, ué? Você deveria fazer o mesmo.

— Hmm...

— Chama ela pra conversar e diz que gosta dela e quer namorar com ela, pô! Aí é só ver o que ela vai dizer.

— Mas...

— Se ela disser que não tem nada a ver, então você deixa pra lá. Mas ao menos vai ter tentado.

— Verdade...

E fui pra casa pensando nessa possibilidade. À noite, liguei para Mi.

— Oi, Mi.

— Max! E aí, tudo em cima com a Bárbara?

— Hahaha! Tá tudo bem entre nós sim, mas eu não sei como agir.

— Como não sabe? Você tem duas opções claras e óbvias!

— Quais?

— Ou você fica na sua caladão aí e deixa a oportunidade passar, ou você diz a ela que gosta dela!

— É... acho que você está certa. Tenho que contar a ela.

— Faça isso!

— Mas como?

— Ah, chama ela pra tomar um sorvete, qualquer coisa assim, e aí você diz.

— Mas como eu digo?

— Puxa, Max, só abra seu coração. Mas não seja melodramático. Basta dizer algo do tipo "Bárbara, eu estou gostando de você. Queria saber se você sente algo, pois quero namorar contigo".

— Certo... Vou ter que criar coragem!

— Desencana! O que acontecer, aconteceu. Só não deixe de tentar.

— Tá! Brigadão, Mi.

— Boa sorte, hein?

— Vou indo. Beijo.

— Beijão, se cuida!

Hmmm... sorvete? É, quem sabe?

Dava-se o nome de calourada a uma festa comumente organizada em início de semestre letivo das faculdades, que tinha como objetivo recepcionar os novos alunos. Na verdade, os veteranos é que realmente aproveitavam essas festas. Costumava-se contratar bandas, DJ's e apresentações diversas para atrair os estudantes. Os alunos da faculdade em questão normalmente tinham desconto, mas qualquer um podia adquirir ingressos.

Essa calourada em questão era de enfermagem, e era realizada numa grande área livre da Universidade. Eu e Mi chegamos por volta das 22:20, após estacionar o carro. Havia várias barracas vendendo bebidas alcoólicas na entrada. Compramos nossos ingressos e entramos. O fluxo de pessoas entrando era grande, e já tinha muita gente do lado de dentro também. Eu deixava que Michelle comandasse a noite:

— Vamos dar uma volta pra ver os ambientes!

— Tá.

Descobri logo que eram dois ambientes, um com DJ tocando música eletrônica e outro com banda, que ainda estava se aquecendo para começar. Demos uma caminhada no meio do pessoal que esperava a banda começar, parando volta e meia para conversar um pouco e olhar as pessoas em redor. Eu estava gostando da festa, pois tinha muitas garotas bonitas. E era a primeira vez que eu conseguia prestar atenção em outras garotas nos últimos três anos.

— Hummm, tá de olho nas meninas, hein?

— Hã? Do que você tá falando?

— Hahaha, deixa de ser bobo, é pra olhar pra elas mesmo.

E enquanto completava essa frase entrelaçou seu braço no meu, como que desafiando as garotas a se aproximarem.

Depois de alguns minutos, fomos ver o ambiente de dance. Era numa área mais distante e uma tenda tinha sido armada, dentro da qual estava o DJ com sua mesa, as caixas de som e um bom jogo de luzes. A animação estava intensa no local. As pessoas vibravam freneticamente ao som ritmado da música.

Eu estava considerando a possibilidade de dançar, quando senti duas mãos tapando meus olhos.

— Quem é?

Ninguém respondeu.

— Xii, eu não vou adivinhar.

— Nem ouvindo a minha voz?

— Bárbara?

Então ela tirou as mãos e me abraçou.

— O que um nerd como você faz numa calourada?

Antes que eu pudesse responder, percebi que ela estava com os olhos em Michelle, que não sorria.

— É a sua namorada?

— Ah... não, não!! Ela é minha amiga! Michelle, essa é a Bárbara, que joga RPG comigo.

Michelle então falou com ela.

— Ah, então você que ocupa os domingos do Max, hein?

— Hehehe, pois é, andamos jogando todo domingo. Ah! Essa é a Kathy, minha amiga.

Só então percebi que tinha uma ruiva bonitona com ela. Eu e Mi falamos com a garota, que usava pouca roupa e atraía os mais diversos olhares. Confesso que o meu também.

Mas notei que Bárbara estava igualmente bonita, de saia solta acima dos joelhos e uma blusinha de alça. Suas pernas eram bonitas.

— Vocês estavam indo dançar? Vamos lá!

E me puxou pela mão para o meio do povo. Kathy e Mi nos seguiram e formamos uma roda. Eu não dançava muito bem, mas estava me virando imitando os movimentos delas.

As músicas eram boas, apesar de que às vezes muito remixadas, tornando árdua a tarefa de reconhecer a música original por trás das batidas. Em mais ou menos uma hora que passamos dançando em grupo, reconheci duas músicas de Angel. Uma delas era justamente "Dancing for me", que tinha tocado naquela festa pouco mais de três anos atrás, no momento em que eu me apaixonara por Nicole.

Aquele instante passou pela minha cabeça, mas fui tirado da reflexão por Bárbara, que me pegava pela mão para dançar mais próximo dela. Ela parecia bastante animada. Só então me dei conta que eu estava dançando com três belas garotas e que metade da pista olhava para nós. Claro que a fonte principal das atenções era Kathy, que não cobria mais de um palmo de suas pernas e atraía os olhares até mesmo dos rapazes acompanhados.

Após cansarmos de dançar, resolvemos beber alguma coisa. Sentamos numa barraca dos formandos de enfermagem, que visavam arrecadar finanças para seu baile. Eu e Mi pedimos coca-cola, Bárbara pediu fanta uva, e Kathy uma cerveja. Mi estava do meu lado esquerdo e Kathy do direito, de forma que Bárbara estava em frente a mim. E, sem perceber, me vi mergulhado em seus olhos cor-de-mel. Como eram lindos! Não reparei nem que ela estava vendo minha admiração, só quando ela deu um sorriso, exibindo belos e brancos dentes envoltos por sua boca vermelha. E retribuiu meu olhar penetrando fundo em meus olhos verdes. Eu não sei dizer quanto tempo passamos assim, imersos nos olhos um do outro. Pode ter sido meia hora ou 30 segundos, mas foi eterno na minha mente. Só saí desse semi-transe místico quando Kathy falou algo:

— Vocês não vão beber seus refrigerantes? Quero dar uma passada no palco, pois tão tocando uns covers de metal muito bons!

Ela e Mi já tinham acabado seus refrigerantes, Bárbara estava na metade do dela e eu mal tinha tocado no meu. Apressei-me, enchendo rapidamente meu estômago de gás, e prontifiquei-me:

— Quando quiserem ir, pra mim tudo bem.

E fomos para o show de metal. Decidi puxar assunto:

— Bárbara.

— Oi!

— Você sempre vem a essas festas?

— Que nada! Praticamente não saio assim, só vim porque Kathy insistiu. E você? Não tem muito jeito de quem curte balada.

— É, não mesmo. Mas dessa eu estou gostando.

E dei um sorriso.

Ela sorriu de volta:

— Eu também.

Passamos alguns segundos em silêncio, que ela quebrou:

— Max.

— Hum?

— Pode me chamar de Babi, tá? Bárbara fica parecendo minha mãe falando.

— Pode deixar, Babi!

Babi...

Ficamos um tempo no show, até que começou uma outra banda que não era boa. Dançamos mais um pouco na arena do DJ e então Kathy quis ir embora. Fomos nos despedindo.

— Até domingo, Bárb... Babi.

— Amanhã, né?

— É mesmo, já é sábado! Então até amanhã.

E ela me deu um abraço e beijou minha face.

Mi olhou para mim e riu. Eu não entendi, e ela disse:

— Quer ir também?

— Se você tiver afim, ok.

— Vamos, então.

E entrelaçou seu braço no meu enquanto caminhávamos em direção ao seu carro.

— Bonita a Bárbara.

— Não é simpática ela?

— Sim, bem mais que uma certa pessoa, devo dizer.

— De quem você está falando?

— Nicole, claro.

— Ué, mas por que você está comparando as duas?

Michelle virou a cabeça e olhou bem nos meus olhos.

— Você não percebeu, não foi?

— Eu não estou entendendo nada!

— Você está se apaixonando pela Bárbara, Max.

Aquela frase desceu pela minha garganta suavemente... Apaixonar... Bárbara...

— Estou?

— Claro, bobo. Passou a noite com os olhos grudados nela, sorriu feito um babaca, puxou assunto, etc., todos os sintomas de uma nova paixão.

— Aimeudeus, acho que é mesmo!

Chegamos ao seu carro, ela me abraçou, encostando sua cabeça no meu ombro.

— Eu não quero que você sofra, Max.

— Mas dessa vez pode ser diferente.

— É, eu creio que sim.

— Você notou algo?

— Bem, mulheres são mais difíceis de interpretar os sinais assim, mas ela com certeza gosta de conversar contigo e lhe acha atraente. Se vai passar disso, eu não sei. E talvez nem ela saiba ainda.

— Hum-rum...

Então entramos no carro e fomos lanchar algo naquela mesma lanchonete onde nos tornamos amigos no ano passado.

— Max!!!

— Oi, Mi. Tudo bom?

— Uma ova!!! Trate de me dar notícias de vez em quando! Faz duas semanas que não nos falamos!!! Que absurdo! Não quero ser mais sua amiga! Hunf!

— Hahaha!

— E você ri, é??? Aff, que falta de consideração!!

— Ei, calma! Eu ia ligar qualquer dia desses.

— Hunf! Seeei...

— Então, é que ando meio sem tempo. Nessa semana começam as provas, e tenho estudado bastante. E no domingo tem o RPG.

— Ah, você me trocou pelos seus novos amiguinhos do RPG, isso sim!

— Deixa de besteira! Vamos fazer o seguinte: sexta acabam minhas provas e aí eu saio com você à noite, que tal?

— Eita!! Sexta tem uma calourada de enfermagem!! Vou te levar pra lá!

— Calourada? E isso presta?

— Vamos ver, também será minha primeira!

— Tá fechado então. Que horas a gente se encontra e aonde?

— Eu passo pra te pegar às 21:30, ok?

— Tá.

— Vai lá estudar, vai. Antes que eu me arrependa de ter relevado sua falta de consideração!

— Hehehe, ok. Beijo pra você, Mi! E até sexta!

— Se cuida!!!

Domingo à noite e a Michelle me liga e fala tudo isso aí! Que drama, hahahaha! Mas ela tem até razão, eu sumi um pouco. Se bem que ela também podia ter ligado, NE? Porque deveria ser eu a ligar?

Hoje jogamos a terceira partida de RPG, está cada vez melhor. Terminamos o dia de hoje semi—mortos após levar uma surra de um dragão! Mas foi muito bacana! Tou doido pra saber o que vai acontecer agora!

Bem, amanhã começa uma semana corrida de provas. Ando estudando direitinho, acho que devo me dar bem.

Começou então a semana. Os dois primeiros dias foram tranqüilos. Fiz boas provas. Uma delas bastante extensa, não me lembro de ter escrito tanto de uma só vez antes. A professora inclusive precisou nos dar mais uma hora, pois o tempo inicial foi pouco. Contudo, na quarta o bicho começou a pegar. Tive uma aula de revisão para a prova de Cálculo Aplicado ao Desenvolvimento de Jogos, e alguns repetentes disseram que era muito difícil. Eu me sentia entendendo o assunto, mas fiquei um pouco desconfiado ainda assim.

Ainda na quarta fiz uma prova de Programação, na qual não me dei tão bem assim. Eu sabia a sintaxe, mas na hora não consegui bolar uma boa solução para uma das questões. Na quinta foi a vez de Álgebra Aplicada ao Desenvolvimento de Jogos e também não me dei tão bem quanto gostaria. Tive dúvidas em várias questões!

E, como esperado, a prova da sexta (Cálculo) não foi nada fácil. Não lembro de ter feito uma prova assim nunca antes na minha vida. Tou com medo da nota. Mas acho que vai dar certo, fiz algumas consciente, outras mais ou menos.

Cheguei em casa umas 18hs da sexta, jantei, joguei um pouco no PC para desestressar das provas, me arrumei, e às 21:40 Michelle buzinou.

Logo o domingo chegou. Almocei cedo, separei algumas folhas, lápis e uns dados que eu tinha comprado anos atrás por achar eles legais (a maioria de 10 faces, e uns poucos de outros tamanhos). Saí de casa, peguei um ônibus e cheguei na graminha da facul meia hora antes do combinado.

Dessa vez, a primeira a chegar foi Bárbara. Ela estava com uma saia na altura dos joelhos, preta, all-star preto, e mini-blusa branca com um desenho de alguma animação japonesa. Como estávamos só nós dois, fui puxando assunto:

— E então, o que você faz aqui na Universidade?

— Eu curso Design, tou no primeiro período! E você?

— Faço Desenvolvimento de Jogos, também estou no primeiro período.

— Ah, legal! Quer dizer que você gosta de videogame, hein?

— Hehehe, gosto sim! Jogo desde pequeno, embora tenha passado uns anos mais parado, mas nunca totalmente. E sempre tive vontade de fazer meus próprios jogos.

— Eu jogo de vez em quando.

— Eita, muito bom!

E conversamos mais alguns minutos sobre jogos recentes que ela tinha jogado, até que o Gary chegou e começamos a fazer nossas fichas. Fomos pro livro escolher raças e classes de personagens. Acabei me decidindo por um elfo druida, com capacidades curativas. Bárbara escolheu uma elfa guerreira, com direito a usar uma imensa espada. Logo Sean e Ju chegaram, ele escolheu um anão bárbaro, e ela um humano arqueiro. Tínhamos um grupo. Dividimos nossos atributos direitinho, sob orientação do Gary. Ele me sugeriu colocar bons pontos em magia, porque mesmo sendo um druida, depois eu poderia aprender algumas magias úteis, mesmo que defensivas, e eu seria um dos únicos capazes. Bárbara poderia aprender algo também, por causa de seu sangue élfico, como o meu. Mas minha classe é bem mais favorável. Ju, com muita dificuldade, e Sean de maneira alguma.

Nomeamos nossos personagens da seguinte forma:

· Max – elfo druida: Halfelas

· Bárbara – elfa guerreira: Talindra

· Julianne – humano arqueiro: Badrorn

· Sean – anão bárbaro: Dwaïn Hogroth

E Gary começou a narração:

“O vilarejo de Raan ultimamente anda sendo pilhado por uma horda impiedosa de orcs. Duas vezes no último mês casas foram destruídas, e saqueadas, e alguns habitantes foram mortos, incluindo mulheres e crianças. A vila é de pescadores e agricultores, então não há combatentes habilidosos para proteger a cidade dos ataques. Um conselho de habitantes decidiu juntar suas moedas de ouro e contratar alguns guerreiros que queiram proteger a cidade.”

Ele tinha pedido pra nós quatro encontrarmos motivos para querermos dinheiro. Cada um revelou apenas a Gary seu motivo. Eu disse que o grupo de elfos da floresta do qual faço parte está desaparecendo. Existem cada vez menos elfos, e eu decidi sair pelo mundo em busca de conhecimento para descobrir a causa de nossa iminente extinção. Mas, como não sabia por onde começar, decidi me aventurar como caçador de recompensas, visando conhecer pessoas e lugares que pudessem me auxiliar.

“Desta forma, interessados em moedas de ouro, vocês quatro procuraram o responsável pela oferta, em Raan. Ele marcou de reunir os quatro ao entardecer.”

Desse ponto Gary continuou narrando os problemas da vila, nos encontramos e fomos à caça dos orcs. Tivemos que nos informar com várias pessoas sobre seu paradeiro, até que encontramos um acampamento com cerca de dez orcs. Eram muitos para um grupo tão pequeno e inexperiente como o nosso, ainda mais levando em conta que um dos membros (no caso meu personagem) não é combatente. Tivemos que planejar alguma estratégia. Conseguimos um cavalo com os habitantes da cidade, e Badrorn era o mais indicado para cavalgar, pois podia atirar flechas enquanto andava (embora para o jogador isso significasse que ele tinha que obter bons e difíceis sucessos nos dados).

Dessa forma, organizamos uma armadilha. Decidimos que Badrorn apareceria de surpresa no acampamento e faria alguma confusão. Como ele era apenas um, supusemos que apenas alguns orcs o iriam perseguir. Quando eles saíssem, Talindra e Dwaïn atacariam impiedosamente os orcs restantes, enquanto eu os curaria conforme fossem se ferindo. Badrorn atiraria flechas nos seus perseguidores e depois de alguns minutos voltaria ao acampamento, onde supostamente (novamente) nós teríamos derrotados os outros e poderíamos ajudá-lo a matar os orcs restantes.

Era um plano bem arriscado, mas foi o único que conseguimos bolar. E logo o pusemos em prática. Badrorn montou no cavalo com estilo, empunhou seu arco e seguiu em direção ao acampamento orc. Alvejou um no braço e saltou com o cavalo por sobre outro, acertando nele com as ferraduras. Os orcs gritaram e cinco começaram a persegui-lo. Os dois feridos ficaram, juntamente com três intactos. Quando os primeiros sumiram, nós aparecemos. Talindra girava sua espada furiosamente e Dwaïn era um verdadeiro monstro. Apesar de sua estatura reduzida, saltava com seu machado dilacerando pedaços de orc para todos os lados. Logo eles derrotaram os cinco, e eu precisei usar minha magia apenas uma vez, em Talindra. Badrorn não teve a mesma sorte. O mestre nos surpreendeu usando um orc que também era arqueiro, e conseguiu acertar duas flechas em nosso companheiro, que tinha conseguido derrotar apenas um dos seus perseguidores e agora estava com o braço impossibilitado de atirar, quando chegaram todos ao acampamento. Apressei-me a curar nosso amigo ferido, enquanto Talindra e Dwaïn atacavam os orcs. Dwaïn levou também duas flechadas antes de conseguir enterrar seu machado na cabeça do maldito orc arqueiro.

Afinal, conseguimos vencer o bando, mas como eu demorava alguns turnos para poder novamente curar as pessoas, Dwaïn e Talindra estavam muito feridos ao final. Mas ficamos felizes por nossa primeira vitória. Conseguimos o ouro e, satisfeitos pelos bons frutos da união de nossas forças, decidimos andar por aí à busca de recompensas como essa (claro que Gary deu um empurrãozinho nesse sentido, hehehe).

Assim acabou nossa primeira partida. Já estava escurecendo quando nos despedimos e fomos cada um pra sua casa. Eu saí muito feliz e animado pela partida excelente! Como tinha sido legal, nossa!

Então combinei com Gary, meu mais recente colega, de buscar jogadores de RPG pela Universidade. Não era uma tarefa nada fácil, devo dizer!

Resolvi ficar meia hora após as aulas rodando pelo campus procurando pessoas que tivessem, sei lá, cara de RPGista! Variei bastante minhas táticas. Passeava um dia pela área de exatas, outro pela de humanas, outro por saúde. Depois decidi ficar sentado num banco que ficava bem na passagem, folheando ilustrações de RPG que eu tinha impresso no meu PC.

Essa última abordagem foi um pouco mais bem-sucedida que ficar rodando a esmo. Mas não suficientemente bem-sucedida. Muita gente passava olhando, mas quando eu olhava de volta e começava a sorrir, se apressavam, ou viravam a cara. Nunca sorriam de volta ou se interessavam.

Também experimentei sentar em bancos com pessoas neles e folhear as ilustrações, para ver se gerava algum interesse. Mas nada. Depois de alguns dias, Gary me ligou e disse que tinha conhecido uma garota e que ela tinha topado jogar conosco, e que bastava encontrarmos uma quarta pessoa e já daria pra jogar.

Após uma semana e meia de busca, eu já estava desistindo. Pensei que Gary poderia encontrar alguém ele mesmo. Sentei-me num banco entre uma aula e outra, pois eu tinha meia hora sobrando. Nem me dei ao trabalho de folhear as ilustrações.

Então, sentou-se ao meu lado uma garota com longos cabelos ondulados, de um louro escuro. Sua pele era branco-amarelada e tinha belos olhos cor-de-mel. Quando dei por mim, ela usava uma blusa preta e tinha escrito em branco “Mulher também joga RPG”!!! Tinha uma jogadora de RPG bem ali do meu lado!!!

Olhei pra ela, mas fiquei com vergonha de começar um papo. Então peguei as ilustrações e comecei a folheá-las aleatoriamente. Meu intento teve sucesso, pois ela falou comigo:

— Oi, você joga RPG?

— Jogo sim. Digo, estou começando agora. Dá pra ver pela blusa que você também joga, né?

— É, jogo. Tou meio parada, mas jogo.

— Ahh... Mas não quer voltar?

— Como assim?

— É que... estamos montando um grupo e precisamos de gente. Não tá afim?

— Eita! Sério? E vocês vão jogar o que???

— A princípio, Medieval Land. Depois pode ser que joguemos outras coisas.

— Medieval Land? Putz, eu tou doida pra jogar a nova edição! É a nova?

— É sim.

— Tou dentro! Meu nome é Bárbara, e o seu?

— Max!

Trocamos telefones e fomos, cada um para sua aula.

À noite liguei pro Gary e ele me disse que tinha encontrado mais um cara. E ficou feliz quando contei da Bárbara.

— Putz! Duas mulheres numa mesa de cinco? Cara, isso é muito raro, tou falando!

— Hehehe, imagino.

Marcamos de nos encontrarmos no final da tarde do dia seguinte, que era uma sexta-feira, para todos se conhecerem e agendarmos algo. Liguei pra Bárbara avisando. A voz dela era bonita ao telefone.

Então no outro dia, às 17:15 (tínhamos combinado 17:30), eu cheguei num gramado sob duas árvores por trás de um dos blocos de Engenharia Civil. Alguns minutos depois, chegou uma garota baixa, magrinha e loira. Sorriu pra mim e se sentou.

— Você é o Max?

— Sou sim. Você é a...

— Julianne, prazer.

Trocamos dois beijinhos nas faces e nem pude perguntar nada porque Gary chegou logo em seguida.

— Opa, já vi que se conheceram.

— É, o Max parece legal.

Que comentário estranho. A garota me pareceu meio maluca, mas divertida.

Com cinco minutos de atraso, Bárbara apareceu. Estava novamente com a blusa com a qual a conheci, dessa vez de propósito, penso eu, para mostrar ao pessoal, hehehe.

— Gary, Julianne, essa é a Bárbara.

— Olááá, que bom ter outra garota por aqui, hein? Pode me chamar de Ju, viu?

— Pois é, garotas também jogam RPG, tá vendo? — mostrando a blusa enquanto falava.

Vinte minutos depois, já achávamos que o cara não ia aparecer, e ele chegou, bem calmo, como se estivesse no horário. Gary foi logo apresentando:

— Pessoal, esse é o Sean. Sean, esses são Max, Julianne e Bárbara.

O tal Sean era alto, muito magro, estava todo de preto, usava óculos e tinha cabelo escuro, curto. Gary estava novamente de boné, ele parecia gostar.

Conversamos meia hora sobre o jogo. Gary seria nosso mestre e todos estávamos empolgados. Sean e Bárbara já tinham jogado antes, mas eu e Julianne não. Seríamos estreantes. Mas Gary dizia o tempo todo que era simples. Todos estávamos ansiosos, então acertamos de começar no domingo à tarde, nesse mesmo local, pois a graminha era confortável.

Nos despedimos e fomos embora. Eu estava empolgado. Parecia uma excelente oportunidade de fazer amigos. Todo o pessoal me pareceu simpático. A Julianne meio maluquinha, e o Sean meio caladão. Mas o Gary é bem legal e Bárbara também. Eu não via a hora de começar a jogar.

E então as aulas começaram. Algumas bastante interessantes, outras um pouco menos. Mas eu estava deveras entusiasmado com o curso e não perdia um minuto de nenhuma aula. Como na época de colégio, gostava de chegar com uma boa antecedência, normalmente de vinte minutos a meia hora. Aproveitava esse tempo para ler avisos, propagandas e notícias pelos blocos.

E assim se passaram as duas primeiras semanas dessa nova fase da minha vida. No sábado seguinte, antes do almoço, telefonei para Michelle.

— Oi, Mi!

— Max!! Que saudades! Nem me liga, né?

— Ué, não estou ligando?

— É, depois de duuuuasss semanas de aula!!! Duas!!

— Ah, desculpa! Acabei me empolgando com o curso!

— Que ótimo! Então você tá gostando mesmo?

— Tou sim! Tem uma ou outra disciplina menos interessante, mas no geral tou achando o máximo! Mas e você, se dando bem?

— Sim, sim! As disciplinas estão divertidas também! Mas, ei! O que você vai fazer mais tarde?

— Humm, ia só dar uma navegada pela net. Por quê?

— Então umas quatro eu passo aí pra te pegar.

— Opa! Pra ir pra onde?

— Ah, sei lá, rodar no shopping, cinema, qualquer coisa é melhor do que ficar em casa! E eu tou com saudades de você!

— Então combinado! Até mais, Mi!

— Beijo, Maxie!

— Outro.

E assim arrumei programa pro sábado à tarde.

Quatro e quinze, Michelle buzinou. Beijei o rosto de mãe e saí. Ela tava de jeans e uma blusa preta bem bonita. Exibia um óculos escuro novo e que parecia ter sido caro.

Entrei no carro e ela me abraçou loucamente!

— Poxa, Max! Faz um tempão que a gente não se vê! Preciso te contar uns babados! Mas a gente conversa no shopps!

— Ok!

Logo chegamos no shopping, sentamos na praça com imensos sorvetes à nossa frente e ela desandou a falar pelos cotovelos:

— Max, você não sabe da maior! Lá fui eu toda animada pra primeira aula de Introdução ao Estudo Veterinário, e quando eu entro na sala, um carinha alto, musculoso e bonitão tasca logo os olhos em mim. Sabe aqueles bem bobos? Bem, burro ele não é tanto pois passou no vestibular. Mas é meio retardado! Não consegue tirar os olhos de mim, não sabe disfarçar nada! Quando foi anteontem, eu saindo da aula apressada, ele vem atrás de mim.


— Michelle?

— Hum?

— Podemos conversar?

— Agora?

— É, eu serei rápido.

— Tá, pode dizer então.

— Não podemos sentar?

Então nos sentamos num banco bem desconfortável e ele falou:

— Então, é que desde o primeiro dia de aula te achei bem gata.

— Como é seu nome mesmo?

— Robert, mas pode me chamar de Robbie.

— Ok, Robbie. Então você disse que sou uma gata. E?

— Bem, eu pensei que talvez pudéssemos sair essa sexta.

— Sair??

— É, vai ter uma festa lá no distrito!

— Ah... bem, é que... dessa vez não vai dar. Deixamos pra outra, ok?

Robbie pareceu desanimado e eu fui logo saindo de cena:

— Agora eu tenho que ir. Até segunda!


— E agora, Max?

Eu só conseguia achar divertida a forma como ela tratara o carinha.

— Você tá rindo, Max??

— Hehehe, foi mal! É que o cara deve ter ficado triste, você o tratou como um ninguém!

— Mas, Max! Ele É um ninguém!

— Hahaha! Eu sei, eu sei. Mas mesmo o cara sendo meio mané e sem-noção, você não pode tratá-lo assim tão mal.

— Por que não?

— Você gostaria que alguém em quem você tivesse interessado te tratasse dessa forma?

— Mas eu não sou imbecil como ele!

— Eu não estou dizendo isso. Gostaria ou não?

— É, acho que não.

— Então o chame para conversar essa semana e diga a ele que não tem interesse. É melhor do que ele ficar pensando que tem chances ou então ficar levando toco seu o tempo todo!

— Humm. É, acho que você está certo, Maxie!

Vimos uma comédia romântica no cinema, comemos batata recheada e depois Mi me deixou em casa.

Na segunda seguinte, não tive a primeira aula. E tinha que esperar pela segunda, então fui dar uma volta pelo campus. Resolvi sentar em um banco e observar as pessoas. De repente, eu até encontrava uma menina bonita. Então, notei um cara de boné com uma camisa preta com um dragão. Ele estava entretido olhando um livro grande.

Disfarçadamente (ou o melhor que pude fazer nesse sentido) observei um tempo ele folhear aquele livro, até que desconfiei se tratar de um manual de RPG. Como eu realmente não disfarço bem, ele percebeu que o olhava e veio até mim.

— Opa, cara! Cê joga RPG?

— Eu? N-não, não. Digo, nunca joguei.

Ele se sentou ao meu lado e continuou a conversa.

— Esse aqui é o manual novo de Medieval Land, já viu?

— Ouvi falar. Posso ver?

— Claro, olha aí!

Devo ter passado uns vinte minutos deliciando-me com as páginas daquele livro, todas coloridas e cheias de desenhos fantásticos. Li por cima algumas coisas, e tudo aquilo parecia ser bem bacana!

— Eu tou procurando gente pra jogar, você não tem uma turma interessada?

— Ah... na verdade não.

— Então o que acha da gente procurar uma galera pra começar umas mesas?

— É?

— Topa?

Refleti uns instantes sobre essa possibilidade e percebi que poderia ser a vida me dando um novo rumo. E esse rumo parecia bem interessante.

— Eu topo sim!

— Beleza! Eu me chamo Garrison, mas pode me chamar de Gary.

— Max!

— Prazer, Max.

Então eu e Gary trocamos telefones e ficamos de buscar por aí pessoas interessadas em RPG. Não que eu tenha muito... tato para falar com desconhecidos do nada, mas não custava tentar. Isso poderia ser legal!

Postagens mais recentes Postagens mais antigas Página inicial

Blogger Template by Blogcrowds