A partida de RPG do domingo anterior tinha sido péssima, o que me motivou a uma decisão: abandonar o jogo. É, pode parecer exagero, mas eu prefiro não encontrar muito com Babi. Não repetirei o erro de me lamentar por anos por algo que não dará certo. E, bem, ela não quer nada comigo, não é? Não dizem que o melhor é esquecer? Pois, decidi tentar.

Dessa forma, telefonei para Gary:

— Gary, sou eu, Max.

— Max! Tudo bom contigo, cara?

— Tranqüilo. Ei, não tenho uma boa notícia para dar.

— Opa! Fala aí!

— Estou deixando o RPG.

— O quê?! Fala sério, Max! Por quê?

— Não estou dando conta dos trabalhos da faculdade nem indo tão bem nas provas, e vou participar de um grupo de estudo que será todos os finais de semana a partir do próximo.

Argh, não gosto de mentir. Mas não me senti bem em dizer a verdade para Gary.

— Putz! Que pena... Sentiremos todos a sua falta, Max.

— Eu sei.

— E se quiser voltar, avisa! Sempre se dá um jeitinho.

— Tá. Falou, então!

Na sexta à noite Michelle me ligou:

— Max, eu quero que você conheça o Morris.

— Morris? O seu namorado?

— Isso! O que acha de irmos a um barzinho amanhã à noite?

— Barzinho? Mas eu nem bebo!

— E eu bebo? Deixa de ser bobo, é só pra sair, ver gente, e lá também vende refrigerante.

— Mas eu não queria segurar vela!

— Que bobo! Você não vai ficar. Ficaremos apenas conversando.

— Bem, pode ser, então. Que horas?

— Te pego às 21. E encontramos com Morris lá.

— Certo.

— E a Bárbara?

— Ah, ta um saco! Decidi sair o RPG para ver se não a encontrando, a esqueço.

— Hmmm, é, pode ser uma maneira. Bom, se cuida, Max! Até amanhã, hein?

— Beijo.

Essa provavelmente seria uma noite estranha. Eu estava quase acostumado a ter Mi bem ao meu lado, pegar na mão dela, abraçar, etc. Seria o tal Morris ciumento? E mais: seria ele alguém legal para Mi? Bem, verei.

Faltando 10 minutos, Mi buzinou. Eu já estava pronto e fui encontrá-la, após despedir-me de minha mãe.

— Nossa, adiantada!

— Tou nervosa.

— Por quê? — fui dizendo enquanto dava-lhe um abraço.

— Ah, sei lá, vai que vocês não se dão bem!

Percebi que ela usava um pouco mais de maquiagem que o costumeiro. Não sabia que ela poderia ter vaidade. Bem, deve estar querendo impressioná-lo.

— Deixe de bobagem e dirija! Vai dar tudo certo.

Então fomos a um bar chamado Crocodile. O ambiente era legal, tinha muitas garotas bonitas (embora não fizessem realmente o meu tipo, que eu nem sabia qual era), e estava tocando música dos anos 80. Sentamo-nos em uma mesa nos fundos.

Com cerca de vinte minutos, Mi se levantou apressadamente e abraçou um cara altão, com cabelos castanhos e jeito de rico. Eles se beijaram, e presenciar a cena acabou sendo uma experiência estranha para mim.

— Max, esse é o Morris. Morris, meu amigo Max.

— Enfim o Max, hein? Michelle fala muito de você?

— É mesmo? Bom saber! Ela também me fala de você.

Cumprimentamos um ao outro e sentamo-nos à mesa.

A noite decorreu tranqüila. O tal Morris estava alguns períodos à frente de Mi e contou a história deles se conhecerem num trabalho de disciplina. Percebi que Mi olhava-o apaixonadamente, mas não sei se ele agia da mesma forma. Provavelmente sim, apenas eu não conhecia sua maneira de se comportar. Digamos que eu não morri de amores por ele, mas também não desgostei. Na verdade, ele não parecia exatamente preocupado com minha “aprovação”. Provavelmente acreditava em suas capacidades. Talvez estivesse certo, não sei.

Quase uma da manhã, Mi despediu-se demoradamente de Morris na frente de seu carro, e fomos embora.

— E então, Max? O que achou dele?

— Ah, sei lá!

— Como “sei lá”? Você o detestou tanto assim?

— Não, não! Apenas não deu para ter uma impressão muito forte. Não gostei nem desgostei, pra ser sincero.

— Certo.

— Você está apaixonada?

— É, eu acho que sim.

— Bom, curta o momento então!

— Brigada, Max! Estou curtindo sim!

Deixou-me em casa, nos despedimos e eu fui dormir, refletindo sobre Mi e Morris.

No domingo teve RPG. Foi a primeira vez em que vi Babi depois da sexta-feira em que ela me deu um fora. Fui o primeiro a chegar, logo sucedido por Gary e Julianne, que já chegaram juntos e de mãos dadas. Gary me pôs a par do que tinha acontecido na última partida e eu já estava até empolgado para jogar.

Foi quando Babi chegou.

Percebi que eu estava realmente apaixonado. Assim que a vi, meu coração disparou, a adrenalina percorreu minhas veias e eu comecei a imaginar coisas. Ela veio falar comigo delicadamente.

— Maaax! Há quanto tempo!

— Oi, Babi. Tudo bom contigo?

Me abraçou e eu já estava agoniado.

Após alguns minutos, Sean apareceu e começamos a partida.

Eu não estava conseguindo prestar muita atenção no desenrolar dos fatos narrados por Gary, e muito menos nas ações dos jogadores, pois meus olhos e meu pensamento não desgrudavam de Babi.

— E então, Max?

— Oi?

— Vai concordar com a proposta de Badrorn?

— Proposta?

— Ué, você não ouviu? De seguir pela caverna para tentar surpreender os hobgoblins?

— Ah, é, é, pode ser.

A partida durou umas 2 horas e meia e quando encerrou, Gary pediu que eu o esperasse. Babi, Julianne e Sean se despediram enquanto eu e Gary arrumávamos as coisas.

— Max, cara, você tava voando hoje! Tive que chamar sua atenção umas três vezes. Tem que prestar atenção na partida, né?

— Putz, Gary, foi mal!

Fui para casa pensando a respeito. Eu realmente não tinha prestado atenção ao jogo, pois só pensava em Babi. Por que as coisas tinham que ser assim? Seria tão bom se estivéssemos namorando, já pensou? Bah...

Passei mais uma semana imerso nos trabalhos da Universidade. Então, no sábado, estreou um filme que eu queria ver, e decidi ir ao shopping. Chamei Michelle, mas ela já tinha marcado de namorar. Saí de casa até meio chateado por me sentir em segundo plano.

Antes do filme, fui fazer um lanche na praça de alimentação. Comprei um sanduíche e estava começando a comer, distraído, quando uma bandeja foi colocada na minha frente.

— Maaaaax!!

Era Isabelle! Eu não a via desde o final do ano passado.

— Isabelle!

Trocamos beijinhos e ela se sentou à minha frente.

— Me conta, Max! Como você tá? E seu curso?

— Ah, tá bacana! Tudo correndo bem, tou me dando bem, etc. E você?

Então conversamos uns quarenta minutos sobre assuntos saudosistas do colégio, e sobre nossas vidas atuais. Até que ela começou um assunto estranho.

— Eu era muito boba, sabe? Nunca te disse nada.

— Hum? Sobre o quê?

— Eu era apaixonada por você, Max.

— O quê?!

— E então? Desde a oitava série! E só fui desencanar perto do final do segundo grau.

— Caramba! Você tá brincando, né?

— Não, não. É sério mesmo, hehehe. Não sei porque nunca tive coragem de te dizer.

Só então percebi que até Nicole aparecer, eu também gostava dela. Nic surgiu para atrapalhar. Caso contrário, eu e Isabelle teríamos namorado.

— Eu... não sei o que dizer.

— Tudo bem. Eu não quis dizer antes porque você gostava da Nicole mesmo, não adiantaria.

— Mas...

— Relaxa, Max, isso é passado.

— Antes de gostar dela, eu gostava de você, Isabelle!

— Agora você tá brincando comigo.

— Mas é verdade!!! Na oitava série!!

— Hahaha! Que coisa, hein? Acho que era nosso destino ter uma paixão não-correspondida durante todo o segundo grau.

— É...

E continuamos a conversar por mais de uma hora. Deixei o filme pra outra oportunidade.

Saí do shopping chocado por ter chegado tão perto de namorar alguém.

Felizmente não houve RPG no domingo seguinte ao novo fora, pois eu preferia não ver Babi agora.

Para minha surpresa, na semana que se sucedeu à fatídica sexta-feira, os professores todos encheram minha turma de trabalhos. Tive que me entrosar com alguns colegas para fazer trabalhos em grupo. E também tive que fazer pesquisas na Internet, ler livros, responder exercícios, preparar apresentações, etc.

Ao final da semana, Gary me telefonou:

— Fala, Max!

— Oi, Gary.

— Domingo vai ter RPG!

— Cara, acho que não vai dar pra eu ir. Tou até o pescoço de trabalhos para a semana que vem, uma loucura!

Sim, isso era verdade. Mas eu poderia dormir menos em algum dia e dar um jeitinho. Contudo, juntando os trabalhos à minha vontade de não ver Babi por uns dias, decidi não ir.

— Puuuutz, mas que mau, hein?

— É, tá fogo!

— Mas e aí, como andam as coisas com a Babi?

— Ah, não vai rolar.

— Sério??

— Pois é, ela não tá afim.

— Ah, tou ligado. Eu falei com a Julianne.

— E aí?

— Ficamos duas vezes. Estamos pensando se queremos algo mais sério.

— Que bacana!

— E então? Muito gata ela!

— Verdade. Ei, Gary, eu vou nessa. Bom jogo pra vocês. No próximo domingo eu volto, beleza?

— Ok, Max. Bons estudos!

E assim passei o final de semana isolado, imaginando como estava a partida de RPG do pessoal. No final da tarde de domingo, Mi apareceu lá em casa de surpresa (não sei como ela adivinhou que eu não tinha ido jogar) e me arrastou para tomar um sorvete com ela.

— E aí, Max? Como andam as coisas?

— Ah, eu nem tenho pensado muito nela. Trabalhos demais a fazer.

— Entendo... melhor assim. Eu tenho uma novidade pra te contar.

— O que houve?

— Tou namorando.

— O queee???

— Ficou com ciúmes, foi?

— Hahahaha, claro que não!!!

— E por que essa reação?

— Só me surpreendi! Mas quem é o cara?

— Por que você tem certeza que é um cara? E se eu fosse lésbica?

— Heeeeinnn???

— É um cara, hehehehe! Ah, ele paga uma disciplina comigo, e eu fiz um trabalho em grupo com ele e outro cara, e aí ficamos conversando de vez em quando antes ou depois das aulas. E achei-o um cara legal. Mas nem tinha pensado em nada além, até que rolou um clima estranho na lanchonete e ele me beijou!

— Uaaaaaaaaau!!!

— E eu gostei do beijo. E daí decidimos namorar!!

— Muito bom, Mi! Fico feliz de saber que você está feliz.

Bem no fundo meu egoísmo me fez crer que nos afastaríamos um pouco agora. Mas esse sentimento se perdia em meio à minha real felicidade por ela estar namorando.

Tomamos mais sorvete e depois voltei para casa.

Cheguei em casa e fui para o chuveiro, correndo. Lá sentei-me no chão debaixo da água corrente e deixei as lágrimas fluírem.

Novamente isso estava acontecendo comigo. Primeiro Nicole. Agora Babi. Nada dá certo na minha vida emocional?

Se eu ao menos fosse mais religioso, teria vocação para monge.

Poxa, e o que significou aquela demorada troca de olhares? Ela parecia gostar de mim, caramba!

Inferno...

Eu não devia ter entrado nessa! Tava tudo tão bem... eu até esqueci Nicole! Mas para quê? Só para colocar outra no lugar dela? Eu não posso começar tudo de novo!! Não mesmo!

Mas será que dessa vez não vai ser diferente? Será que eu não a conseguiria conquistar? O que eu perderia tentando? Ah... eu não sei mais...

Saí do chuveiro e liguei pra Michelle.

— Oi, Mi.

— O que houve, Max? Pela sua voz, parece que você acaba de levar um... não!!!

— É, isso mesmo.

— Você ligou pra ela?

— Chamei-a pra tomar um sorvete hoje.

— E aí??

— Aí eu disse que tava gostando dela, que nossos gostos combinavam, que eu a achava interessante e queria saber o que ela sentia.

— E ela?

— Disse que sentia muito, mas só me via como amigo.

— Putz...

— Pois é.

— Você tá em casa?

— Tou.

— Posso ir aí?

— Pode.

— Tá, em meia hora eu chego. Beijo!

Uma hora depois ela bateu lá em casa. Minha mãe já tinha chegado e eu disse que Mi vinha jantar e sugeri que ela pedisse uma pizza.

Mi entrou, cumprimentou minha mãe e fomos pro meu quarto.

Sentamos na minha cama, encostados na parede.

— Como você tá?

— Sei lá...

— Como "sei lá", Max?

— Ah... é, eu tou triste.

Ela me puxou e me fez deitar a cabeça no colo dela. E começou a afagar meus cabelos.

— Essas coisas acontecem, Max.

— É, mas só eu tenho tanto azar.

— Não. Não é só contigo. E isso não é azar. É que você é especial, e está procurando alguém especial também, não é fácil de encontrar.

— Caramba! Agora que eu esqueci Nicole, tava todo animado com Babi e me acontece uma dessas!

— Melhor não dar certo antes de começar do que depois, você sofre menos.

— E quem disse que não daria certo? Como ela pode saber antes de tentar?

— Mas não seria correto ela tentar sem sentir nada por você.

Passamos mais uma meia hora naquela conversa, até que minha mãe bateu pra avisar que a pizza estava na mesa. Jantamos, depois jogamos bastante videogame, e vimos clipes na Internet. Mi saiu lá de casa no meio da madrugada.

Postagens mais antigas