A História Real da Vida Real

E realmente eu estava apaixonado. O final de semana passou lentamente. Fiquei a maior parte do tempo pensando em Nic. Joguei um pouco de videogame e fui com minha mãe visitar uns primos, mas nada de interessante. E pior, nada que pudesse desviar minha atenção. Não sei se era falta de algo maior para pensar ou se realmente só tinha Nicole na minha cabeça agora.

Tirei o domingo pra dormir, só pra não estar pensando em Nicole o dia todo. Almocei quatro da tarde e jantei às nove da noite. Aluguei um filme e assisti antes da janta. O resto do dia foi na cama.

E aí chegou a segunda. Ah, aula novamente. Ou melhor, ver Nicole novamente! Como sempre, cheguei bem cedo à sala. Brad, Tom e Mike já estavam lá. Falavam da festa, claro. Quando me viram, percebi que se calaram alguns instantes e então começaram a falar duma menina da sala ao lado da nossa.

— E aí, pessoal?

— Oi, Max. — respondeu Mike.

Tom e Brad apenas acenaram e continuaram seu papo.

Por que tinham mudado de assunto? Falariam de mim e Nicole? O que eles estariam pensando sobre a gente? Afinal, passamos toda a festa juntos. No mínimo, estavam me achando lerdo por não ter ficado com ela. Mas deviam estar irritados pela garota mais bonita do colégio estar dando bola para mim! Ha! Ha!

Quando pensava nisso percebi Isabelle sentada em seu lugar habitual, anotando alguma coisa num caderno pequeno. Aproximei-me dela e puxei assunto da maneira descontraída com a qual estava acostumado:

— Hummm, está escrevendo segredos no diário, hein? Opa, vou ler!

Ela não sorriu e apenas respondeu secamente:

— Oi para você também, Max.

— Oi, Isabelle. Como passou o fim de semana?

— Muito bem, obrigada.

Algo estava diferente. Mas mal pude eu refletir sobre o assunto e tudo escureceu ao meu redor. Apenas a porta estava iluminada, pois Nicole passava por ela. Eu nada ouvia, apenas sentia o perfume de Nic me chamando. E o segui como um bobo, não, como um apaixonado.

— Bom dia, Nicole!!

— Oi, Max!

Ela sorriu alegremente e passou a mão no meu rosto enquanto passava ao meu lado, se dirigindo ao seu lugar habitual. Após ela passar, notei o mundo se acendendo novamente e o professor entrando na sala.

Física. Corpos em movimento. Referencial. Mecânica. Já tínhamos visto muito disso no ano anterior e eu me recordava bem. Então aproveitei a aula para relaxar embebido no perfume de Nic, que estava agora por toda a sala. Eu tinha que descobrir que aroma era aquele.

Como eu poderia ficar a sós com ela? Na escola isso seria impossível. Ou pelo menos muito difícil. Será que ela não topava ir ao cinema comigo? Teria eu coragem suficiente para convidá-la? Ah, não sei...

Aí veio a aula de álgebra. Progressão aritmética. Confesso que me interessei pelo assunto. Eu realmente gostava bastante de matemática.

Por fim, aula entediante de biologia. E o intervalo!

Virei-me para a carteira de Nic enquanto levantava e vi que ela estava vindo já em minha direção. Estava com um CD na mão.

— Olha, Max. Eu trouxe pra que você ouça melhor.

Era o CD da tal Angel. Como era bonita a jovem cantora. Imensos e lisos cabelos negros, pele branca como neve e olhos azuis como duas safiras. Usava uma roupa azul e a foto era no gelo. O CD tinha doze músicas.

— Obrigado, Nicole. Escutarei hoje mesmo.

Por que eu não conseguia falar nada de interessante na frente dela?

— Você vai lanchar?

— Não...

Droga! Eu deveria ter dito que sim e convidado ela para lanchar comigo!

Afastou-se e foi - conversando com duas meninas que sentam junto a ela – dirigindo-se à praça de alimentação do Aristóteles.

Os dias passavam rápida e lentamente. Quando eu estava na presença de Nicole, passava tudo muito rápido e quando eu percebia tinha acabado mais um dia letivo e eu só a veria no dia seguinte. Mas quando eu estava em casa, era cada vez mais devagar. Eu fazia os exercícios, e passava o resto do dia jogando videogame e pensando em Nic.

Vez por outra Fred vinha me visitar e jogávamos um pouco, relembrando nossos bons tempos.

Nesse ritmo chegou a sexta-feira.

Aula de História. O magnífico professor entrou na sala acompanhado de Janice. Algum recado ia ser dado.

— Bom dia, turma. Demétrius e eu queremos conversar com vocês sobre dois assuntos. Na verdade, apenas um diz respeito ao professor. Importa-se de me deixar falar primeiro, professor?

— Claro, Janice, que não. Pode falar à vontade.

— Muito bem. Como vocês sabem, todos os anos o Aristóteles realiza as Competições Internas Poliesportivas. Normalmente situadas em abril, esse ano foram antecipadas para março.

Como era de se esperar, ao receber uma notícia dessas, a turma logo passou a comentar uns com os outros, sem se dar conta da presença da coordenadora à nossa frente.

— Silêncio, pessoal. Continuando, esse ano haverá uma novidade. A competição será unificada e cada esporte valerá pontos numa tabela, e a sala que terminar o CIP com mais pontos ganhará direito a uma viagem no final do ano.

O espanto foi geral. Alguma coisa tinha acontecido. A diretora Yoko não costumava fazer esse tipo de gasto. Ou ela estava tramando alguma maneira de ganhar em cima dessa viagem, ou alguma outra pessoa estava patrocinando isso.

Uma garota que estudava comigo há anos, chamada Maureen, levantou a mão em pedido de voz.

— Janice, para onde será a viagem?

— Ah, essa é uma surpresa que vocês só saberão quando o CIP acabar.

Mais uma vez a turma exclamou. Palpites de possíveis lugares já eram trocados entre os alunos, em cochichos quase inaudíveis. Olhei para Nicole e vi que ela estava sorridente com a idéia.

— Bom, o CIP desse ano possuirá as seguintes modalidades: vôlei feminino e masculino, basquete feminino e masculino, handebol feminino e masculino, futebol de salão masculino, futebol de campo feminino e masculino, judô, caratê, natação masculino e feminino, e algumas novidades, agora não só mais no campo físico, e sim no mental, como damas, xadrez e quebra-cabeças lógicos. Essas constituem a primeira etapa do CIP. Dessa etapa, apenas as quatro salas com mais pontos serão classificadas para a etapa seguinte. Como será a competição na segunda etapa vocês só saberão quando a primeira se encerrar.

A classe estava em polvorosa com tanta novidade.

— Para concluir, semana que vem eu trarei os folhetos de inscrição de equipes e as regras de cada modalidade. Agora, passarei a palavra para o professor Demétrius.

— Caros alunos jurássicos, tive no último fim de semana uma idéia genial. A levei para a diretora Yoko e, com ajuda de Janice, ela aprovou. Então trouxe minha idéia hoje para mostrá-los, e ver se vocês a acham tão genial quanto eu.

Ele nos chamava de jurássicos. E disse que a cada etapa do aprendizado nós evoluiríamos, e, ao fim do ano, ele esperava estar nos chamando de contemporâneos.

— Não sei se vocês sabem, mas há um museu a uma hora e meia de distância daqui, numa cidade vizinha, que possui um imenso acervo da Idade Moderna. Como estamos entrando nessa filosofia, eu pensei que poderíamos tirar um sábado para fazer uma aula mais dinâmica, e conhecer o museu e a cidade.

A turma vibrou com a idéia e a aprovação foi imediata. Janice nos interrompeu para concluir:

— Pessoal, só queria avisar que a assinatura de seus pais será necessária para a realização da viagem e na próxima reunião escolar a idéia será apresentada, para saber se eles também aprovam. A data da viagem será divulgada na próxima semana, pelo próprio professor Demétrius.

Eu já estava radiante. Será que Nicole jogava alguma coisa? Eu não gostava de esportes, mas pretendia participar do CIP nas modalidades mentais. E quanto à viagem... ah, eu só pensava em ver Nic novamente de saia, sem aquela farda comum. Como era linda...